A infância é a fase em que o desenvolvimento cerebral está a todo vapor, principalmente nos primeiros anos de vida. Para aproveitar esse período propício à aprendizagem, um número crescente de pais e cuidadores vem optando pela inserção de um novo idioma na educação escolar de suas crianças.
Estimulá-las é fundamental para proporcionar o seu desenvolvimento pleno, seja cognitivo, social, linguístico ou motor. E, tratando mais especificamente da aprendizagem de um novo idioma, esse estímulo também possibilita a expansão do seu repertório cultural, uma vez que ele estimula a ampliação de sua visão de mundo e de sua forma de pensar.
Contudo, os benefícios de expô-las a uma segunda língua desde cedo vão muito além da proficiência no idioma e de melhores oportunidades no futuro. Eles fazem a diferença durante todo o processo do desenvolvimento infantil e influenciam diretamente os anos seguintes de suas vidas.
Desenvolvimento cognitivo
De início, pode ser que os pais tenham a sensação de que, ao serem expostas a uma segunda língua, as crianças passam a apresentar atrasos ou se atrapalham nos dois idiomas, misturando o português e a língua adicional numa mesma frase, por exemplo. O que deve ser considerado, no entanto, é o processo para controlar a linguagem pelo qual elas passam, algo que também acontece entre adultos bilíngues e multilíngues, como nos mostra um recente artigo da BBC News. Mas há diferenças.
Um adulto monolíngue que começa a estudar um novo idioma aciona áreas cerebrais diferentes daquelas que são usadas por quem o aprende na infância. Um estudo feito pelas universidades McGill, no Canadá, e Oxford, no Reino Unido, publicado na revista Veja aponta que quanto mais tardio for o aprendizado de uma língua adicional, menor tende a ser a eficiência cerebral para adquirir esse conhecimento devido à especialização do cérebro na língua materna.
Cabe ressaltar que a capacidade de aprender é inerente ao cérebro independentemente da idade. Contudo, o aprendizado de uma segunda língua por crianças pequenas acontece de forma natural, pois a parte do cérebro que processa essas informações ainda está em desenvolvimento. Para os adultos, o processo pode ser mais difícil — ou até frustrante — porque o cérebro já passou pela fase de maturação.
Além disso, o cérebro da criança tem uma grande plasticidade e passa pelo que chamamos de “janelas de oportunidade”, períodos específicos ao longo do seu desenvolvimento que são mais propícios para assimilar e se adaptar a novos aprendizados. (Leia nosso artigo sobre a relação entre a neurociência e o bilinguismo para saber mais e conhecer os benefícios dessas teorias aplicadas à educação.)
Habilidades comunicativas e socioemocionais
Quando o assunto é desenvolvimento infantil e aquisição de uma segunda língua, o aprimoramento dessas habilidades é um dos benefícios mais interessantes. Afinal, é por meio da linguagem que conseguimos nos expressar e construir relações sociais.
Aprender uma nova língua traz ganhos significativos às habilidades de comunicação. Com eles, a criança se torna menos tímida e mais autoconfiante nas interações sociais, vantagens que podem ser observadas de imediato, mas que ela carrega ao longo de toda a sua vida.
Além disso, ao aprender um outro idioma, os pequenos têm contato com a cultura onde ele se origina e podem desenvolver maior empatia por outras pessoas e compreender com mais profundidade o significado de diversidade. É importante que, desde cedo, eles aprendam sobre os costumes e características de outros povos.
Em outra oportunidade, falamos mais a fundo sobre a importância de trabalhar a diversidade cultural na escola e o grande desafio para os educadores nessa questão. Vale conferir! Afinal, a escola que valoriza a diversidade cultural é a que melhor prepara o aluno para a vida.
O desenvolvimento das habilidades comunicativas também estimula o desenvolvimento das habilidades socioemocionais, que estão diretamente ligadas à capacidade de gerenciar os próprios sentimentos. Com elas, a criança se torna mais apta a passar pelos possíveis percalços da vida escolar, manter relações sociais positivas, participar mais das atividades de modo geral e tomar decisões de forma mais responsável e consciente. Como consequência, ela se torna mais bem-preparada para enfrentar as situações adversas até a vida adulta.
Um novo olhar sobre o mundo
A aprendizagem de uma outra língua nos permite ver o mundo de maneira mais flexível e ampliada. Ela influencia diretamente nossa capacidade de refletir, interpretar e nos expressar, e, no caso dos pequenos, lhes permite exercitar desde cedo as habilidades de discernir, ponderar e atribuir valor a partir do contato mais amplo e diverso que o novo idioma proporciona.
Panos Athanasopoulos, professor de linguística e língua inglesa da Universidade de Lancaster, na Inglaterra, defende que há uma ligação indissolúvel entre linguagem, cultura e cognição. Para explicar como a língua influencia nossa visão de mundo, ele compara o idioma japonês, que possui nomes para os diferentes tons da cor azul, com o inglês, que conta com menos variações.
Segundo ele, isso não quer dizer que quem fala inglês não enxergue a mesma gama de azuis existente no vocabulário japonês, mas a forma de descrever os seus tons é diferente entre os falantes de cada idioma. Os que falam somente o japonês tendem a distinguir os tons de azul mais facilmente que aqueles que falam somente o inglês. Isso sugere que falar outras línguas e conhecer outras culturas refina o olhar e amplia os horizontes.
No caso das crianças, esse é um grande benefício. A chance de experimentar a vida através de mais de uma língua as ajuda a compreender desde cedo a pluralidade ao redor e aumenta as fronteiras de seus conhecimentos. E isso estimula o seu desenvolvimento pleno para se tornarem cidadãos capazes de ser, estar e agir no mundo.
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