Antes de falarmos sobre como o desenho pode ser uma potente ferramenta na aprendizagem da língua adicional, vamos refletir um pouco sobre outra questão:
Qual a sua experiência com arte quando criança?
Nós professores estamos em formação desde que iniciamos nossa vida escolar. Trazemos conosco e passamos adiante o que aprendemos e vivenciamos. Alguns de nós tivemos experiências ótimas, outros nem tanto. Precisamos refletir sobre quais dessas experiências valem a pena passar adiante e quais precisam de um novo olhar.
A experiência e a relação que tivemos com a Arte na nossa infância influencia como atuamos com ela em sala de aula. Por conta disso, para muitos de nós, a arte é quase inerente ao desenho, ainda que ela tenha várias facetas.
Mas, o que é desenho?
Edith Derdyk, artista, escritora e formadora de professores, nos diz que “Talvez pudéssemos inverter a pergunta e enunciar que o sujeito que desenha – seja criança, seja adulto – , é quem reinventa o que um desenho é e pode ser!”
Essa reinvenção pode começar pelos materiais. Podemos usar uma folha de papel sulfite A4 e um lápis, mas é importante termos a consciência de que há outros materiais. Além deles, também é importante pensar nas linguagens, já que a criança se expressa de várias formas. Nenhuma é mais importante que outra, e todas têm o seu lugar. Não nos comunicamos apenas através da fala e da escrita, mas de outras formas também: as roupas que escolhemos vestir ou a decoração da nossa casa, por exemplo.
Chamamos de suporte aquilo que serve de apoio para o nosso desenho, seja ele um pedaço de madeira ou papelão, um espelho, vidro, um prato, o chão… E os riscadores, aquilo que usamos para desenhar, além de lápis, canetinhas e pincéis de variados tamanhos, podem ser pedaços de linha, lã ou barbante, elementos da natureza como galhos e pedras, ou qualquer outro objeto que torne o desenho concreto. Você já parou para pensar nos materiais que pode tentar reinventar nas aulas de língua adicional? O que pode ser usado a favor da arte e da aprendizagem de uma outra língua?
O experimentar nos permite “sair da caixinha” e conhecer sensações, ter novas percepções e descobrir nossas próprias capacidades, aumentando a confiança e a autoestima. E isso tem tudo a ver com aprender outro idioma. Nós experimentamos, vivenciamos, saímos completamente da nossa zona de conforto. É um grande ponto de intersecção entre essas duas áreas, língua e arte.
Mas, e quando escutamos: “Não sei desenhar”? Existe um parâmetro a ser seguido? Existe certo ou errado?
Quando ouvimos isso, precisamos nos perguntar em que modelo essa pessoa está se pautando para achar que não consegue. Dessa afirmação, entende-se que ela tem um modelo a ser atingido, e que, se não o atinge, sente-se incapaz. Outra questão além da expectativa é o julgamento, a crítica, afirma Edith Derdyk.
Há também um outro paralelo entre arte e aprendizagem de uma língua adicional. Alguns alunos tendem a dizer que “não sabem falar nada na outra língua”, e/ou “que não entendem nada.” Se eles forem bilíngues emergentes, ou seja, se estão construindo seu repertório linguístico e possuem algum conhecimento, mesmo que pouco, em língua adicional, o desenho pode ajudá-los a encontrar uma forma de se fazerem entender.
E da mesma forma que procuramos expor os alunos a falantes proficientes na língua adicional, também é importantíssimo apresentar-lhes diferentes artistas, não para servir-lhes de exemplo do que devem desenhar ou dar-lhes um padrão, mas para ampliar seu repertório artístico e cultural. Colocá-los em contato com diferentes pontos de vista e formas de ver o mundo cria oportunidades para repensar o que se apresenta em termos de diversidade de repertório e de traços, meios e suportes.
Além disso, também é essencial refletirmos sobre como respondemos ao que os alunos produzem. Com base no que diz Edith Derdyk, devemos nos perguntar: o ambiente no qual a produção artística deles se dá é seguro? É livre de comparações e juízo de valores? Para assegurar-lhes que podem inventar e criar como quiserem, é importante que o professor adeque as expectativas que tem sobre os desenhos que os alunos farão e também que eles entendam as expectativas que devem ter sobre seus próprios desenhos.
É preciso ter em mente que sempre haverá desafios e que não existe perfeição. “No fazer artístico é necessária a capacidade de compor relações qualitativas para um ‘bem ajuste’, isto é, saber articular várias matérias, experimentar relações e fazer juízos sobre os resultados, rever e experimentar alternativas. […]. Na perspectiva da educação, a capacidade de compor e de articular ideias, de saber pensar com os sentimentos, inerente à prática artística, pode ajudar capacitar o indivíduo a saber agir e julgar, de forma sensível, consciente e responsável, num mundo onde as regras são mutáveis.” (Uma Escola Chamada Eu: A exploração da identidade através da expressão plástica. Sílvia Andreia Nascimento Prazeres Moreira, 2111.)
Mas, como saber o que esperar das crianças?
Uma boa estratégia é nos colocarmos no lugar deles. Fazemos isso quando experimentamos fazer nós mesmos o trabalho de arte que será proposto a eles. Dessa forma, tornando o processo íntimo para nós, teremos mais argumentos no momento de conversar com eles e entenderemos melhor suas dificuldades. É preciso “tornar visíveis os processos e compartilhá-los para dar sentido, para reverberar” (Ateliê do Cotidiano, Editora Diálogos).
E depois que o desenho é produzido, o que se faz com ele?
“A criança faz uma constante escuta poética da natureza, assim como de si mesma, dos outros, da vida humana. O seu olhar é de indagação e descoberta, questionamento e admiração, um olhar filosófico de aprender a ver o mundo.” (O voo dos que ensinam e aprendem: uma escuta poética. Ed. Diálogos.)
A apreciação dos trabalhos das crianças é uma forma de escuta. Observá-los atentamente e reconhecer os esforços feitos é apreciá-los. Mas ressaltamos também a importância de expô-los em paredes, quadros e painéis. Imagine que atrás do desenho feito por cada uma existe todo um universo que esteve com ela durante a sua produção. É injusto pensar que essas criações, depois de tudo o que vivenciaram, possa acabar no fundo de uma gaveta.
A conversa sobre como foi a experiência também é muito importante para que reflitam sobre processos, técnicas e materiais. E se tudo isso for feito em língua adicional, perceba o quanto elas estarão desenvolvendo em termos de expressão e linguagem!
Finalmente, como dito no início deste artigo, a arte tem o poder de ajudar no desenvolvimento da autoestima e da confiança. Portanto, ao expormos seus trabalhos, contribuímos para que sintam-se reconhecidas e orgulhosas do que produziram, mesmo que inconscientemente.
“Quando os professores refletem e se confrontam sobre as escolhas e as ações que cumprem, a consciência das suas propostas com as crianças aumenta de maneira significativa. Tornam-se mais capazes de escutar as crianças, de estar em sintonia com as suas estratégias de aprendizagem e mais disponíveis para introduzir mudanças nas práticas” (RUBIZZI, 2014, p.96)
Ao usarmos a língua inglesa com a arte, as propostas e atividades são mais facilmente assimiladas. Elas fogem do abstrato e se concretizam quando sentimos, pensamos, opinamos, fazemos escolhas e expressamos quem somos. A união dessas duas ferramentas é potente para tornarmos nossas crianças bilíngues!
Arte é experiência. É ciência. Ela nos tira do ordinário e nos leva para o extraordinário. Arte são múltiplas linguagens!
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